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CADERNO DE RESUMOS

ARTE, CIÊNCIA E FICÇÃO

 

 

Adriana Veríssimo Serrão (CFUL) 

“Autonomia do estético ou soberania da arte? Sobre a interpretação de Kant por Georg Simmel”
No ensaio "Kant und die moderne Ästhetik", publicado pela primeira vez em 1903, Georg Simmel apresenta uma brilhante exposição das linhas gerais da estética de Kant, celebrado como o génio que antecipou toda a estética moderna. O eixo central da argumentação sustenta que a autonomia do sujeito estético – a grande descoberta kantiana – anuncia a soberania da arte que ele próprio defende como conquista de finais do século XIX. Dá-se aqui uma deslocação sub-reptícia do plano em que Kant se coloca: quais as condições a priori da possibilidade da apreciação estética? – para este outro: quais os modos de manifestação de uma obra como estética?

 

 

Diogo Ferrer (FLUC)

"Juízo Estético em Kant e Filosofia da Arte no Idealismo Alemão"

Esta comunicação procura contribuir para uma compreensão comparativa e de desenvolvimento dos modelos teóricos dentro dos quais a filosofia clássica alemã pensou a estética, examinando a transformação da base kantiana que permitiu a Schelling e a Hegel construir as suas filosofias da arte. 

Mostra-se que a definição da arte por Schelling e Hegel tem por condição teórica as principais determinações do juízo de gosto kantiano, nomeadamente o seu caráter desinteressado e de finalidade sem fim. Examina-se os conceitos artísticos e estéticos de teleologia nos diferentes autores, e mostra-se como a liberdade característica da arte em Schelling e Hegel tem por condição o seu caráter reflexivo conforme tematizado por Kant. O caráter não conceptual do juízo de gosto é comparado com a conceptualidade da arte em Hegel e, como conclusão, mostra-se que a abordagem dialética da arte segundo Hegel tem como antecedente a dialética do juízo de gosto segundo Kant. 

 

 

Diogo Sardinha (CFUL)

“A arte e os limites da experiência”

A estética de Kant complexifica o problema dos limites e o pensamento das fronteiras. Na Crítica da Faculdade do Juízo, certas representações da imaginação chamadas Ideias tendem a algo para além dos limites da experiência. E no centro da análise das faculdades que constituem o génio, a mesma obra dá-nos o exemplo por excelência desta obra de cruzamento. Veremos como aí se dá o salto para além das fronteiras, interessando-nos pelo trabalho do artista, e sobretudo do poeta, na imaginação daquilo que não pode ser conhecido.

 

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Fernando M. F. Silva (CFUL)

“Poesia, jogo do espírito humano. Uma perspectiva kantiana”

Até à data, muitos leitores de Kant não entendem ainda a importância do conceito kantiano de poesia, e em especial do conceito kantiano de poesia em um enfoque pragmático. Este último é ainda negligenciado, ou visto como o resultado de um simples processo imaginativo, processo imaginativo esse que é todavia irrelacionável com a racionalidade, pois a poesia não pode ser vista como uma força autónoma, capaz de animar as faculdades do espírito, nem como uma força motriz dotada de um propósito que não o de deleitar ou criar novas imagens. Contudo, é nossa opinião que, na antropologia de Kant, o conceito de poesia é de facto apresentado como um conceito de especial relevância, especialmente nas secções dedicadas ao problema da imaginação (Einbildung) humana. Aqui, Kant propõe uma revolução ao nível da posição, da função e da disposição comum das faculdades humanas, assim se separando da Metafísica de Baumgarten e da antropologia fisiológica de Platner, e, mediante isto, apresenta a singularidade da sua proposição de uma Antropologia Pragmática enquanto ciência. Em suma, é nosso objectivo descobrir aquelas que, para Kant, eram potencialidades ímpares na disposição poética do Homem; mostrar como o conceito de poesia de Kant não apenas pressupõe, mas é também pressuposto no seio de um novo e revolucionário arranjo ou redisposição das inferiores faculdades imaginativas, e clarificar como, na sua unicidade, uma tal disposição poética das faculdades inferiores beneficia as faculdades superiores, bem como o conhecimento racional, assim cumprindo um objectivo maior da antropologia kantiana: o de, no seio do ânimo humano, alcançar aquele raro plano harmonioso que põe em marcha uma espécie de prazer antropológico ímpar, o prazer de encontrar algo comum a todos os humanos, que claramente está na base da empresa crítica do autor.

 

Giorgia Cecchinato (UFMG, Belo Horizonte)

“A importância da dimensão ideal do sensus communis na Crítica da faculdade de julgar de Kant”

Todas as tentativas de atualizar o pensamento de pensadores clássicos provocam sempre um certo ceticismo nos históricos da filosofia, pois estas tentativas acontecem normalmente às custas do pano de fundo metafísico. No presente trabalho, proponho analisar o caminho tortuoso da fundamentação do sensus communis e pretendo mostrar que o único modo para entender e compreender a atualidade deste conceito é levar em conta a sua ancoragem metafísica. A atitude reflexiva desinteressada na contemplação artística não pode ser apenas um pressuposto, mas deve ser uma tarefa, uma tarefa de se tornar humano para quem é humano.

 

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João Lemos (IFILNOVA)

“Limitações, Incitamentos e Valor Estético: o papel das ciências históricas na produção artística e na apreciação estética da arte”

Esta comunicação aborda o papel desempenhado pelas ciências históricas – os seus conceitos, as suas regras, os seus exemplos – na produção artística e na apreciação estética da arte. Partindo da noção kantiana de ‘beleza aderente’, e focando-me no caso da ‘arte bela’, proporei que as ciências históricas desempenham um papel de natureza dupla: elas funcionam não apenas como limitações, no que concerne à produção e apreciação da arte, mas igualmente como condições de possibilitação e incitamentos à descoberta de novas regras e atribuição de valor estético a objectos artísticos que as descobrem.

 

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Leonel Ribeiro dos Santos (CFUL)

“Ilusão poética e poética da ilusão. Considerações sobre uma peça pouco conhecida do espólio de Kant”

Proponho-me desenvolver um comentário sobre uma peça pouco conhecida do espólio de Kant, na verdade, o esboço em latim de um discurso de arguição (Entwurf zu einer Opponenten-Rede, AA 15.2:903-935) de uma dissertação académica sobre as ficções poéticas apresentada à Universidade de Königsberg no ano de 1777. Essa peça, embora de origem ocasional, revela-se interessante porque dá azo a que Kant, na altura ocupado com a redação da Crítica da Razão Pura, enuncie as suas ideias sobre a poesia e os processos poéticos, constituindo toda ela uma muito peculiar Poética in nuce, que se virá a explicitar em escritos posteriores, nomeadamente, na Crítica do Juízo (§§ 53-54) e na Antropologia numa abordagem pragmática (§§ 8-11 e 13), mas também na própria Crítica da Razão Pura (A293-299 / B 349-355), aqui a propósito de um tema tão central como é a noção de “ilusão <ou aparência> transcendental” (der transzendentale Schein) que é responsável pela dialética da razão pura, uma «dialética que lhe é natural e inevitável pois está inseparavelmente ligada à razão humana, cabendo à Dialética Transcendental descobri-la e evitar que ela engane» (KrV B 353-354). Mostrando o caráter positivo da ilusão ou aparência poética, que distingue do mero engano dos sentidos, o filósofo põe em destaque o livre “jogo da mente” com as suas representações, um jogo no qual “ela joga <ou ilude> mas não é iludida”, havendo por isso lugar a uma aparência  ou ilusão que não engana a mente, mas antes a aviva, a excita, e lhe dá prazer, e isso mesmo que estejamos certos de que é uma mera ilusão.  Para além de constituir um roteiro para os ulteriores afloramentos do tema na obra kantiana, a peça permite-nos compreender melhor a pertinência de alguma receção do pensamento de Kant, nomeadamente em Schiller, na sua noção de “aparência estética” (ästhetische Schein), mas também  no Nietzsche da “vontade de aparência” ou “vontade de ilusão” (Wille zum Schein) e em Hans Vaihinger, na sua ideia, tomada aliás de Kant, de uma filosofia das ficções conscientes de que o são, ou uma filosofia do “como se” (Als Ob). 

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Nuria S. Madrid (UCM, Madrid)

“A sabedoria poética em Kant: lições para o progresso científico”

A reflexão kantiana sobre a poesia como uma das belas artes constitui apenas uma breve indicação se o conferirmos com as inúmeras intervenções que versos de poetas clássicos mostram em momentos importantes da argumentação crítica. O uso que Kant faz da linguagem poética confirma que para o pensador este nível do discurso oferece conteúdos de sabedoria que resultam altamente úteis para o leitor interessado na obra crítica e para o científico. A intenção principal desta fala será identificar a conexão entre poética e retórica no texto crítico como uma especie de infraestructura discursiva que abrange a interpretação, por vezes excesivamente objectiva, das teses sustentadas nele. 

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Patrícia Kauark-Leite (UFMG, Belo Horizonte)

“Kant e a função heurística das imagens”

Pretendo neste trabalho refletir sobre a função heurística das imagens no processo criativo de produção do conhecimento científico. Para tanto, tomo como ponto de partida a interpretação de Leonel Ribeiro dos Santos em sua ideia de uma heurística transcendental a fim de melhor investigar a força criativa e original do gênio científico, aqui considerado como talento ou capacidade por meio da qual a faculdade intuitiva da imaginação é colocada a serviço da faculdade conceitual da razão. A minha perspectiva não é a de me ater à letra mas ao espírito da filosofia kantiana para compreender no contexto das teorias físicas contemporâneas, em especial da teoria quântica, a função não representacional das imagens intuitivas na explicitação de conceitos que não se deixam conformar a nenhuma intuição.

 

 

 

Paulo Jesus (CFUL)

“A liberdade construtiva da imaginação e o vínculo kantiano entre Poética e Antropologia”

 

Resumo.

 

No âmbito da Crítica da Razão Pura, a imaginação desempenha uma função cognitiva crucial, dada a sua participação na atividade sintética que torna possível a experiência pela aplicação dos conceitos à matéria sensível. Porém, o poder da imaginação produtiva manifesta uma espontaneidade poiética plástica que transporta uma ambivalência fundamental, isto é, possui a eficácia ambígua de criar ordem e desordem cognitiva. Na imaginação produtiva, as conexões entre imagens efetuam-se entre as leis sensíveis da associação e as regras concetuais da ordenação necessária. Assim, a imaginação pode gerar sínteses reguladas e organizadas com valor epistémico universalizável, quando submetida à sintaxe lógica do entendimento, mas também pode confinar-se num domínio onírico, idiográfico ou idiocósmico, sintetizando novas imagens radicalmente singulares, disruptivas da ordem estético-lógica comum, no limiar do absurdo e da loucura. Para Kant, a virtude das Artes e da Poesia reside na espontaneidade capaz de estabelecer uma aliança entre o sensível e o inteligível, transcendendo produtivamente a sua heterogeneidade. A espontaneidade da imaginação revela uma ligação íntima com a autonomia e autotelia da Liberdade, através do seu poder de produzir fins e formas, sendo que, em última instância, é o próprio caráter humano que encerra em si mesmo uma abertura autoformadora, na qual a poética, a ética e a antropologia epigenética se articulam e se entr’exprimem no vértice da imaginação como capacidade de futurição. A Antropologia numa perspetiva pragmática propõe um processo desenvolvimental onto-ético que pressupõe e demonstra uma antropoplastia fundamental, em que a força poiética da imaginação opera no centro dinâmico da inteligência orientada para o infinito virtual da inventividade histórica e do aperfeiçoamento qualitativo da pessoa humana na aventura da Humanidade.

 

 

 

Virginia Figueiredo (UFMG, Belo Horizonte)

“Sobre abismos, pontes e travessias”

Servindo-me como fio condutor das metáforas que dão título a este trabalho e que são recorrentes nos textos do próprio filósofo, Immanuel Kant, e da maioria de seus/suas comentadores/ras, recortei alguns temas que a Crítica da Faculdade de Julgar nos oferece a pensar e que ainda permanecem atuais: o sistema, a crítica, a reflexão, o sublime e certo conceito de humanidade. Privilegiei os/as intérpretes portugueses/as e brasileiros/as, sem prescindir dos autores franceses, eternos aliados, que me inspiram desde o início dos meus estudos.

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